Seu navegador n�o suporta JavaScript. Algumas fun��es deste site podem n�o funcionar.
Receba as atualizações do site por rss ou

Ser bissexual é uma tendência para o futuro?

É comum que pessoas que sentem atração por mais de um sexo sejam vistas como ‘indecisas’ e ‘libidinosas’.

Bissexualidade

Bissexualidade

A bissexualidade é um tema que está cada vez mais em pauta e isso se deve ao fato de que o número de pessoas que se identifica com essa sexualidade aumentou. De acordo com uma pesquisa feita pela J. Walter Thompson, 65% da geração Y (pessoas entre 21 e 30 anos) se identifica como heterossexual, contra 48% da geração Z (13 e 20 anos). A porcentagem de homossexuais continuou a mesma (6%). A mudança está no número de pessoas que afirmam ter algum grau de bissexualidade. Será que essa é uma tendência para o futuro?

“A bissexualidade, enquanto desejo e comportamento sexuais com pessoas independente do sexo genital é comum em toda a história do ser humano. Graus intermediários e diferentes de bissexualidade já foram demonstrados em pesquisas das décadas de 1930 e 1940, embora muitos tendam a deixar estes conhecimentos históricos de lado”, explica o psicólogo Oswaldo Rodrigues Jr., diretor do Instituto Paulista de Sexualidade.

Para ele, o crescimento de pessoas com algum grau de bissexualidade entre as gerações Y e Z não necessariamente representa um crescimento das pessoas que são, efetivamente, bissexuais.

“Um dos fatores coerentes com este aumento é a percepção de que se pode ou até se deve experimentar mais as vivências sexuais, portanto, muitos podem se encontrar num rótulo bissexual neste momento, porém, podem mudar daqui a 5 ou 10 anos”, opina. Na pesquisa, 60% dos entrevistados da geração Z acham que as pessoas exploram mais sua sexualidade hoje, 7% a mais do que a geração Y.

Na opinião do psicólogo, “não se trata de uma mudança de comportamento das mesmas pessoas, mas de grupos etários diferentes, que estiveram expostos a formas diferentes de informações e conceitos”.

Preconceito. A estudante Cláudia Piazza Costa, 21 anos, é bissexual e afirma que existem duas grandes vertentes de intolerância com essa sexualidade: serem indecisos e libidinosos.

“Por alguns anos, ainda ouvi: ‘você já decidiu se gosta de homens ou mulheres?’. Não era uma pergunta feita na malícia, ou pra me machucar necessariamente. Era apenas que eles [amigos e família] não entendiam direito a bissexualidade. Hoje entendem e aceitam tranquilamente e não temos mais problemas com isso”, relata.

Luiz Filipe Motta, 22 anos, concorda que são os dois aspectos os maiores focos do preconceito com bissexuais. “Sempre me pergunto: a quem diz respeito, além de mim, se eu for sexualmente indeciso ou tiver muitos parceiros? Por que é algo visto como ruim? Como afeta quem não se relaciona sexualmente comigo, a não ser atingindo o âmago dos seus preconceitos, ou reforçando-os? Eu acho que é direito de cada um ser como é, e não vou deixar de ser quem sou só para contrariar um clichê criado por gente preconceituosa.”

Sobre a falsa ideia de que bissexuais são pessoas indecisas, o psicólogo é incisivo: “Não é uma fase de transição. Nunca foi. E para os que se identificam assim nunca será uma transição. O bissexual não é um homossexual que não saiu do armário. O bissexual é bissexual.”

Descoberta e aceitação. Tanto para Cláudia quanto para Luiz Filipe a descoberta da bissexualidade aconteceu de forma natural. “Acredito que me descobri bissexual mesmo quando passei a conhecer mais sobre o movimento e entender minha própria sexualidade – até porque antes da adolescência, não pensava nisso. Eu só era bem aberta em falar quem eu achava que era bonito, mesmo que fosse uma menina”, relembra a estudante.

Para Luiz Filipe, sempre houve uma suspeita de que não se interessava apenas por mulheres que, depois, foi confirmada na prática. “Fui percebendo que eu realmente tinha uma atração sexual pelo masculino, também. Até que um dia, numa festa de uma amiga, decidi que era hora de provar um beijo e ver o que eu sentia ‘ao vivo’. E não deu outra: gostei desse outro lado”, relata.

Há uma diferença entre a percepção da bissexualidade entre homens e mulheres. Cláudia nota que há mais mulheres que se assumem do que homens, e que isso acontece por causa do machismo. “Homens bissexuais frequentemente são lidos como ‘gays enrustidos’, que não querem assumir que são gays e usam a bissexualidade para se esconderem, ao contrário de mulheres que são lidas como aventureiras e que estão passando por uma fase antes de se casarem com um homem”, interpreta.

“É como se, ao beijar outro homem, o homem perdesse a masculinidade, que é encarada por uma fatia da sociedade como algo essencial para se gostar de mulheres (a mesma fatia que restringe sua percepção de lésbicas às masculinizadas). Então, há um certo confinamento dos bissexuais”, complementa Luiz Filipe.

Representatividade. É comum que os bissexuais se sintam pouco representados dentro da comunidade LGBT. Oswaldo afirma que eles ainda se sentem excluídos, especialmente por causa das acusações de serem “indecisos”. Luiz Filipe concorda com a análise e diz que quem se identifica com essa sexualidade é, no máximo, abrigado.

“Representação inclui criar ídolos de fácil identificação, inclui tornar uma possibilidade, inclui buscar segurança social para essas pessoas, inclui correr atrás de políticas específicas para esse público e, principalmente, incluir ter valores que sejam saudáveis para esse grupo. E nada disso tem sido interesse da comunidade LGBT, já há muitos anos”, opina.

Futuro. Para Cláudia, o movimento para o futuro é que os rótulos de sexualidade deixarão de ser necessários. “No fim, acredito que a liberdade é a sexualidade do futuro, onde todos serão como querem, terão as experiências que querem e não serão julgados e reprimidos por isso”, diz.

Luiz Filipe acredita que, no futuro, a tendência é assumir a própria bissexualidade. “A medida que vamos tendo círculos mais amistosos aos ‘bis’, onde as consequências sociais sejam amenizadas em meio a uma recepção mais amorosa, e principalmente à medida que os ‘bis’ vão se empoderando e se assumindo e, com isso, ganhando representatividade, acho que mais ‘bis’ tenderão a se assumir e batalhar para viver sua vida e sua orientação sexual de forma digna e completa.”

Fonte: Jornal Estadão